Endometriose
A endometriose é uma doença inflamatória crônica caracterizada pela presença de glândulas e estroma endometriais fora da cavidade uterina, principalmente na região pélvica, em órgãos como ovários, tubas uterinas, bexiga e intestino, além dos ligamentos uterossacros.
O primeiro relato sobre endometriose é atribuído ao médico patologista Carl Von Rokitansky, que em 1860 usou o termo adenomioma para se referir às lesões endometrióticas.
Já no início da década de 1920, o ginecologista norte-americano Albert Sampson publicou o primeiro artigo sobre endometriomas, um tipo de cisto ovariano preenchido por líquido marrom comum em mulheres com endometriose nos estágios mais avançados.
Nos anos seguintes, ele se tornou um dos principais estudiosos da endometriose, com diversos artigos publicados, inclusive propondo a teoria da menstruação retrógrada, uma das possíveis causas da doença.
Hoje, milhares de estudos de diferentes profissionais são apresentados na literatura científica mundial.
O que causa a endometriose?
A endometriose é uma doença que normalmente afeta mulheres no período reprodutivo (menacme), ou seja, entre a menarca e a menopausa, embora possa ocorrer em qualquer idade. É considerada a doença ginecológica mais comum da mulher moderna: a estimativa é de que ela afete aproximadamente 200 milhões de mulheres em todo o mundo.
Apesar de ser diagnosticada habitualmente durante o menacme, a endometriose pode também ser encontrada em mulheres antes da menarca e após a menopausa.
Embora a causa exata de endometriose ainda permaneça desconhecida desde que ela foi descrita pela primeira vez – a abordagem epidemiológica é bastante controversa em razão de diversos fatores que dificultam uma análise mais precisa –, diversas teorias surgiram para explicar o surgimento do tecido endometrial anormal fora da cavidade uterina.
A mais aceita até hoje é a do fluxo retrógrado, proposta por Sampson em 1927. Sugere que fragmentos de células do endométrio que deveriam ser eliminados pela menstruação retornam pelas tubas uterinas e se implantam em outros lugares, geralmente na superfície peritoneal ou na superfície serosa de outros órgãos pélvicos.
A teoria da metaplasia celômica também é aceita atualmente por explicar a incidência da doença em meninas na pré-puberdade. De acordo com ela, as células que originam o endométrio durante o processo germinativo permanecem no peritônio e, sob certos estímulos, sofrem metaplasia, processo pelo qual um tipo celular se transforma em outro dando origem ao tecido endometrial ectópico.
Nos dois casos, o tecido ectópico resulta em inflamações, que podem provocar diferentes sintomas, impactando a qualidade de vida das mulheres portadoras, incluindo infertilidade.
Além disso, a adenomiose, condição na qual o tecido anormal cresce no miométrio, camada intermediária e muscular do útero, também é fortemente associada à incidência de endometriose. No entanto, normalmente é diagnosticada em mulheres com mais de 40 anos que tiveram filhos, embora possa ocorrer em qualquer idade, inclusive na fase reprodutiva da mulher.
Assim como na endometriose, o desenvolvimento do tecido anormal provoca um processo inflamatório e a formação de bolsas, que manifestam sintomas e podem interferir na fertilidade durante o menacme.
A endometriose se apresenta em diferentes formas: como aderências pélvicas, implantes ou cistos ovarianos, os endometriomas. É classificada de acordo com critérios como local de implantação, quantidade e profundidade das lesões, comprometimento funcional do órgão e o número de endometriomas.
Veja como a endometriose é classificada
A endometriose é classificada em quatro estágios de desenvolvimento e, morfologicamente, em três subtipos.
No primeiro estágio, os implantes são isolados e sem aderências significativas, enquanto no último são múltiplos, superficiais e profundos, com aderências densas e firmes:
- Estágio I, endometriose mínima: apresenta implantes isolados e sem aderências significativas;
- Estágio II, endometriose leve: apresenta implantes superficiais, menores do que 5 cm e sem aderências significativas;
- Estágio III, endometriose moderada: tem como característica a presença de endometriomas, de múltiplos implantes, além de aderências nas tubas uterinas e ovários mais evidentes;
- Estágio IV, endometriose grave: caracterizada pela presença de múltiplos implantes, superficiais e profundos, endometriomas, além de aderências densas e firmes.
Já os subtipos morfológicos são endometriose peritoneal superficial, endometriose ovariana e a endometriose infiltrativa profunda. Na endometriose peritoneal superficial, há a formação de pequenas lesões no peritônio, planas e rasas; na ovariana, ocorre a formação endometriomas; na infiltrativa profunda, como o nome sugere, lesões profundas invadem diversos locais ao mesmo tempo.
A endometriose está entre as doenças estrogênio-dependentes, por isso tende a diminuir após a menopausa, quando os níveis do hormônio são mais baixos. Por outro lado, há maiores chances de desenvolver em mulheres expostas ao hormônio. Por isso, entre os principais fatores de risco estão a nuliparidade (nunca ter tido filhos), a menarca precoce, os fluxos menstruais intensos e duradouros e os ciclos menstruais de curta duração.
Quais são os sintomas de endometriose?
Por ser uma doença de crescimento lento, a endometriose geralmente não apresenta sintomas nos estágios iniciais, mas isso pode variar. Mulheres com endometriose superficial podem apresentar sintomas exuberantes e perder qualidade de vida. Em estágios mais avançados, quando há múltiplos e profundos implantes, a mulher pode manifestar diferentes sintomas ou ser assintomática.
Da mesma forma que o endométrio normal, estimulado a cada ciclo menstrual pela ação do estrogênio, torna-se mais espesso para receber o embrião e descama se a concepção não ocorrer, provocando a menstruação, o tecido anormal (ectópico) também reage ao hormônio, intensificando os sintomas comuns do período menstrual: o tecido anormal pode sangrar durante a menstruação, aumentando, ao mesmo tempo, a quantidade de fluxo menstrual e a severidade das cólicas.
Em alguns casos, podem ocorrer, ainda, manchas avermelhadas antes da menstruação. Assim, dor pélvica principalmente e alterações do ciclo menstrual são os dois principais sintomas que alertam para a possibilidade de endometriose.
A dor pélvica pode se apresentar como dismenorreia, cólicas severas antes e durante o período menstrual e como uma dor repentina ou intermitente, que pode ser pulsante e aguda, tornando-se mais intensa ao longo do dia, provocada, nesse caso, pelo rompimento de endometriomas. Dispareunia, que é a dor durante as relações sexuais, pode ainda ocorrer.
Lesões presentes na bexiga e intestino, por outro lado, resultam em mudanças nos hábitos como dificuldade de micção, quase sempre acompanhada de dor, micção frequente e presença de sangue na urina, constipação cíclica, dor ao evacuar ou sangramento retal durante o período menstrual.
Na adenomiose, as irregularidades menstruais também são comuns. No entanto, ao mesmo tempo que os implantes provocam aumento no fluxo menstrual, o sangramento tende a ser prolongado ou ocorrer entre os períodos menstruais. Dispareunia, aumento do volume uterino, sensibilidade uterina, inchaço e pressão abdominal estão ainda entre os sintomas.
Como a endometriose é tratada?
O tratamento de endometriose pode ser farmacológico ou cirúrgico, de acordo com a severidade dos sintomas e o desejo da mulher de engravidar no momento.
Se não houver a intenção de gravidez e os sintomas forem mais leves, para aliviá-los são prescritos medicamentos anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) e hormonais que inibam a menstruação.
Para mulheres com sintomas mais severos e que desejam engravidar, pode ser indicado o tratamento cirúrgico por videolaparoscopia para remoção de implantes, aderências e endometriomas, mas é importante fazer a preservação da fertilidade feminina antes da cirurgia porque ela afeta a reserva ovariana e pode prejudicar ainda mais a fertilidade.
A abordagem terapêutica de adenomiose é semelhante, entretanto o procedimento cirúrgico só é possível quando as lesões ainda não invadiram profundamente o miométrio.
Em casos graves, para pacientes que não querem ter filhos e preferem um procedimento definitivo, pode ser indicada a histerectomia, retirada completa do útero, com ou sem preservação dos ovários.
As chances de gravidez aumentam bastante após o tratamento, no entanto, se não houver sucesso, é indicado o tratamento de reprodução assistida.